quinta-feira, 23 de maio de 2019

QUINTA-FEIRA DE RODADA DUPLA


2º ROUND: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Não pretendo entrar no mérito do julgamento, já que ele ainda não terminou, mas, como jurista e criminalista, estou profundamente decepcionado, mais uma vez, com o Supremo Tribunal Federal (STF), que deveria ser a Corte Máxima brasileira, exemplo a ser seguido.

Porém, pensando bem, ela é um exemplo que é seguido pelos demais tribunais do país.

Se o STF pode fazer o que faz, as instâncias superiores copiam.

Não é preciso se respeitar a Constituição Federal, a Lei Maior de nosso país, que determina como as coisas deveriam ser.

Infelizmente, um ditado comum no meio jurídico é cada dia mais real: a Constituição é o que o Supremo diz que é.

Não importa o que esteja escrito; se o STF entende outro sentido, esse é que prevalece.

Recentemente, uma dessas decisões tristes foi tomada quando se autorizou o cumprimento antecipado da pena de prisão antes do fim do processo. Nossa Carta magna é bem clara ao prever que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença. É impossível se entender de outra forma essa frase.

Contudo, hoje, dia 23 de maio de 2019, novamente, estamos diante de mais um exemplo da falta de competência jurídica de nossos ministros, que deveriam ser o que há de melhor entre os juristas brasileiros, aqueles a quem se espelhar.

O que diz nossa Carta Política:

Art. 5º, 
XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal.

O que isso quer dizer?

Que ninguém poderá ser condenado criminalmente por uma conduta que uma LEI não diga que seja um delito.  

Ou seja, apenas o Poder Legislativo, através do Congresso (deputados e senadores) pode determinar se uma ação é crime ou não, não importa a gravidade.

Isso se chama garantia da legalidade penal.

Ela serve para que nós, cidadãos, possamos saber o que é crime ou não, sem se preocupar com o que o juiz vai decidir. Basta ler a lei. E, por consequência, não podemos ser penalizados pelo que não é crime.

Até hoje.

Nossa Constituição Federal, como uma lei, já tinha previsto que racismo era um crime.

Não existe dúvida de que seja racismo. Preconceito decorrente da cor da pele, especialmente se a pessoa for preta, fruto de anos de escravidão no Brasil e todo o histórico decorrente.

Ninguém pode ser tratado de forma diferente por causa da cor da pela, por isso, o racismo foi considerado um crime previsto na Constituição e tratado de forma mais severa.

Contudo, não existia, ainda uma lei de racismo, que disciplinasse o que constituiria racismo e a pena respectiva. Por isso, ninguém poderia ser punido por racismo criminalmente.

Então, em 5 de janeiro de 1989, foi editada a Lei nº 7.716, que regulou este crime.

Respeitou-se a garantia da legalidade, um dos pilares de qualquer democracia.

Agora, o que ocorreu em Brasília hoje?

Hoje, boa parte do que se aprende sobre Direito Penal, as regras mais básicas, foi jogada no lixo. O Direito é uma ciência, mas, aqui, nada mais foi respeitado.

Segundo a garantia da legalidade, apenas a conduta descrita em lei é crime e ninguém pode ser punido por comparação, por analogia.

Ou a conduta é ou não é crime. Simples assim.

Porém, hoje, o STF atendeu ao clamor de uma parcela específica da população e considerou a homofobia um delito, mesmo sem previsão legal. Sem lei que diga que sim.

Um partido político e algumas associações ajuizaram uma ação direta de inconstitucionalidade por omissão afirmando que o Congresso estaria violando direitos dos grupos LGBT... ao não criminalizar a homofobia e que, por isso, deveria ser utilizada a lei de racismo no seu lugar, até que esse crime fosse disciplinado pelo Legislativo.

Segundo o STF, a orientação sexual (hétero, homo, bi...) pode ser tratada como a raça de cada um (branco, preto, amarelo, índio...), pois ninguém a escolhe e simplesmente nasce assim, não podendo, por isso, sofrer qualquer discriminação.

E que o Congresso, propositalmente, estaria sendo omisso ao não criminalizar essa conduta, essa discriminação.

Então, para quando ocorrer um caso de homofobia, será utilizada lei do racismo, com as condutas e penas ali previstas.

O Congresso poderá criar uma lei específica para homofobia, mas nunca mais descriminalizar, já que o STF já determinou ser um crime.

Como mencionei, não vou adentrar no mérito do julgamento e dos argumentos. A discussão seria muito longa e cada um teria sua opinião.

Porém, é de se pensar o seguinte:

O que impede, hoje, que o Supremo Tribunal Federal, não resolva criminalizar outra conduta do dia a dia, porque os 11 (onze) ministros, por pura opinião pessoal, pensem que deve ser assim? Até o ato mais ordinário, mais comum do dia a dia pode ser considerado um crime amanhã sem que exista uma lei tratando-a como um crime.

Em uma república, especialmente, em uma democracia, é preciso se respeitar as instituições. Nós, cidadãos, devemos respeitá-las e elas entre si.

O Legislativo é o corpo de deputados e senadores que foram eleitos para nos representar e criar as leis que vão reger nosso país.

A Constituição é a lei das leis e ninguém pode "passar por cima" dela, até mesmo o Legislativo. 

O Judiciário é um corpo de funcionários públicos concursados que deveria apenas aplicar a lei ao caso concreto, respeitando a legislação criada pelo Legislativo e as normas fundamentais da Lei Maior.

Infelizmente, a cada dia, por omissão do próprio Legislativo, que deixou de fazer seu papel, o Judiciário está assumindo esse espaço, porque ele é obrigado a julgar toda causa que lhe é apresentada, inclusive, esta em debate.

E o Judiciário também está a cada dia mais sendo infectado pelo clamor público e a necessidade de "mostrar serviço" à população. 

Porém, nós como cidadãos, deveríamos ser mais ativos e criticar qualquer medida que se mostre contrária aos pilares da República.

Aqui, o Poder Judiciário está, mais uma vez, criando leis, com desculpas fajutas e sem fundamento. E nosso Congresso, novamente, fica apenas assistindo, parado a usurpação de suas funções constitucionais.

Compete, agora, ao sistema como um todo, acompanhar os desdobramentos dessa decisão que, certamente, ainda irão render muitas discussões.

Os grupos LGBTQ... procuraram o STF em busca da defesa de seus direitos, correto?

Então, esses mesmos grupos deveriam fazer uma autocrítica sabendo que a busca desses direitos, tal como foi posta, desrespeita o direito deles próprios e de todo um país.

Já dizia o ditado que corre em Brasília:

"Pau que bate em Chico (não) bate em Francisco"...

Hoje, sou Francisco, mas amanhã posso ser Chico.

Fica a reflexão...

Links:

https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2019/05/23/maioria-do-stf-vota-a-favor-da-criminalizacao-da-homofobia.htm

https://brasil.elpais.com/brasil/2019/05/23/politica/1558635166_112275.html

https://g1.globo.com/politica/ao-vivo/stf-retoma-julgamento-que-pode-criminalizar-a-homofobia.ghtml

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